O Banco Central decidiu nesta quarta-feira (17) manter a taxa Selic em 15% ao ano, o nível mais alto em quase duas décadas.
A decisão, antecipada pelo mercado, reflete a postura cautelosa da autoridade monetária em relação à desaceleração da economia e à necessidade de controlar a inflação.
A taxa básica de juros permanecerá nesse patamar até, pelo menos, 5 de novembro, data da próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom).
A manutenção da Selic reitera o mesmo conteúdo do comunicado anterior, evidenciando que o Copom vê pouco espaço para flexibilização no curto prazo.
Conforme o texto, o cenário local é marcado por expectativas de inflação desancoradas, projeções acima da meta e resiliência do mercado de trabalho, mesmo com sinais de desaceleração da atividade econômica.
Cortes nos EUA e cautela no Brasil
Enquanto o Brasil manteve os juros, o Federal Reserve, banco central dos Estados Unidos, anunciou um corte de 0,25 ponto percentual em sua reunião de hoje, reduzindo a taxa para a faixa entre 4,00% e 4,25%.
Esse movimento reflete a perda de impulso do mercado de trabalho norte-americano, que criou apenas 22 mil vagas em agosto, bem abaixo das 75 mil esperadas.
A diferença entre Brasil e EUA ilustra as prioridades distintas: enquanto o Fed ajusta sua política após dois anos com juros no nível mais alto em duas décadas, o BC adota uma abordagem mais cautelosa devido a incertezas fiscais, volatilidade cambial e tensões geopolíticas geradas pela guerra comercial entre Brasília e Washington.
Brasil no pódio mundial
Com essa decisão, o Brasil mantém o segundo maior juro real do mundo, de 9,51%, atrás apenas da Turquia (12,34%) e à frente de países como Rússia (4,79%), Colômbia (4,38%) e México (3,77%).
O ranking, elaborado pela MoneYou e pela Lev Intelligence, revela que a média global é de apenas 1,45%.
De acordo com o economista-chefe Jason Vieira, responsável pelo estudo, mesmo que o Copom tivesse reduzido a Selic em 0,25 ponto percentual, o Brasil permaneceria na mesma posição.
Ele ressalta que, no Brasil, a manutenção dos juros altos também serve como um recado ao campo fiscal, em um contexto de incertezas sobre a sustentabilidade das contas públicas.
O recado do Copom
No comunicado, o BC destacou que “o cenário continua a ser marcado por expectativas desancoradas, projeções de inflação elevadas, resiliência na atividade econômica e pressões no mercado de trabalho”.
Diante desse cenário, o colegiado reafirmou que “a política monetária em um patamar significativamente contracionista por um período prolongado” é a única maneira de garantir a convergência da inflação à meta de 3% no horizonte relevante.
O Copom também enfatizou riscos importantes em ambos os lados. No campo inflacionário, alertou para a possibilidade de maior persistência nos preços de serviços e uma depressão cambial mais intensa, especialmente se as tensões externas aumentarem.
No lado desinflacionário, indicou a chance de uma desaceleração econômica doméstica mais acentuada e a queda global nos preços das commodities.
Expectativas de mercado
A pesquisa Focus, divulgada na segunda-feira (15), mostra que os agentes econômicos projetam uma inflação de 4,8% para 2025 e de 4,3% para 2026, ambas acima da meta, o que reforça a cautela do Copom.
Para o PIB, as previsões indicam um crescimento de 2,28% neste ano, sinalizando uma resiliência, mas com desaceleração gradual.
O relatório Pré-Copom da XP, elaborado a partir de entrevistas com 25 gestoras multimercados, apontou que a manutenção da Selic já era consenso, e a novidade diz respeito às projeções de longo prazo: as instituições reduziram a expectativa para a taxa no final de 2026 de 12,6% para 12,25%.
Impactos no câmbio, renda fixa e Bolsa
A decisão reforça a atratividade do real em relação ao dólar, visto que os juros brasileiros permanecem elevados em comparação aos cortes esperados nos EUA.
Pesquisa da XP revela que 68% dos gestores estão investindo no real, contra 41% em julho, apostando em um dólar mais fraco.
Na renda fixa, a manutenção da Selic fortalece as aplicações em títulos atrelados ao CDI a curto prazo, mas também pode abrir espaço para a valorização dos prefixados e dos papéis indexados à inflação, caso o mercado antecipe cortes para 2026.
Na Bolsa, a interpretação é de que o ambiente permanece misto. Empresas relacionadas ao consumo e setores cíclicos, que dependem de crédito, ainda enfrentam os impactos dos juros altos. Por outro lado, bancos e exportadoras podem se beneficiar de margens robustas e um câmbio favorável.
O que esperar à frente?
A sinalização do Copom indica que não haverá cortes no curto prazo, mas analistas enxergam a possibilidade de início da flexibilização em meados de 2026, dependendo do comportamento da inflação e da credibilidade da política fiscal.
O próprio comunicado deixou a porta aberta para ajustes: “O Comitê enfatiza que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados e que não hesitará em retomar o ciclo de ajuste se julgar necessário.”
Em resumo, o BC destaca que prefere agir com cautela excessiva em vez de arriscar perder o controle da inflação.