A derrocada da Ambipar (AMBP3), empresa de gestão ambiental que já foi considerada uma das grandes promessas da “nova economia verde” na B3 (B3SA3), entrou em um novo e dramático capítulo.
Em apenas um mês, as ações da companhia despencaram de R$ 14,10 para cerca de R$ 0,75, uma queda superior a 90% em outubro — e 93% no acumulado do ano.
Com esse desempenho, a Ambipar se tornou a segunda maior queda de 2025 entre todos os papéis da Bolsa, de acordo com levantamento da Elos Ayta, e entrou oficialmente na faixa das penny stocks — empresas cujas ações valem menos de R$ 1.
O movimento reflete a crise de confiança generalizada entre investidores, após fortes incertezas sobre a real situação financeira do grupo e suspeitas de risco de insolvência, isto é, a incapacidade de honrar suas dívidas no curto prazo.
A ofensiva judicial e o “escudo” contra credores
O estopim da crise veio com o pedido da Ambipar à Justiça no fim de setembro. A empresa obteve uma medida cautelar na 3ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro, garantindo proteção temporária contra credores por 30 dias — prazo que pode ser prorrogado por igual período.
A decisão suspendeu execuções, arrestos de bens e cobranças judiciais, além de travar cláusulas de vencimento antecipado de dívidas, o que impediu que os bancos executassem seus créditos.
Na prática, o pedido funcionou como uma “prévia” de recuperação judicial, movimento que, embora legal, foi visto como um sinal de alerta máximo para o mercado.
A medida, porém, gerou reação imediata. Os bancos credores, liderados por instituições internacionais como o Deutsche Bank, questionaram a escolha da praça jurídica. Alegam que a empresa “fabricou uma sede no Rio de Janeiro” apenas para obter uma decisão mais favorável e, com isso, dificultar a atuação coletiva dos credores.
“O Grupo Ambipar até agora não explicou o verdadeiro motivo por trás da propositura da cautelar”, afirmou o Deutsche Bank em documento encaminhado à Justiça fluminense, representado pelos escritórios Pinheiro Neto e Bermudes Advogados.
A Ambipar, por sua vez, respondeu que a revogação da medida teria “efeitos devastadores”, não apenas para a companhia, mas também para a economia e o emprego.
Segundo a empresa, mais de 23 mil empregos diretos e milhares de indiretos estariam em risco caso a proteção fosse derrubada.
Onde está o dinheiro?
O ponto mais sensível da crise — e que tem alimentado desconfiança entre investidores — está no paradoxo do caixa. No balanço do segundo trimestre de 2025, a Ambipar reportou R$ 4,7 bilhões em caixa e equivalentes.
No entanto, segundo fontes ouvidas pela Broadcast, os credores só conseguiram localizar cerca de US$ 80 milhões (aproximadamente R$ 400 milhões), valor quase dez vezes menor do que o declarado oficialmente.
Essa discrepância levantou suspeitas sobre transferências entre subsidiárias, estruturas internacionais e possíveis operações cruzadas que dificultariam a rastreabilidade do dinheiro.
A falta de explicações claras por parte da companhia e a ausência de transparência em relação à liquidez real ampliaram o temor de insolvência.
A situação se agravou quando o Deutsche Bank pediu à Justiça a reconsideração da medida cautelar que impediu o vencimento antecipado das dívidas — sinalizando um impasse cada vez mais tenso entre a Ambipar e seus credores.
XP liquida COEs ligados à Ambipar e Braskem
A turbulência envolvendo a Ambipar também atingiu produtos estruturados do mercado financeiro.
A XP Investimentos (XPBR31) informou a seus clientes que está liquidando antecipadamente os Certificados de Operações Estruturadas (COEs) atrelados a títulos de dívida (bonds) da Ambipar e da Braskem (BRKM5) emitidos no exterior.
De acordo com informações obtidas pela Broadcast, os COEs da Ambipar devem devolver apenas 6,88% do valor investido, o que implica perda superior a 93%. No caso dos papéis da Braskem, o retorno estimado varia entre 26,6% e 36,9% do capital aplicado.
A liquidação foi acionada automaticamente após os bonds das empresas caírem para abaixo de 50% de seu valor de face, disparando cláusulas contratuais de proteção aos investidores.
Os pagamentos serão efetuados na sexta-feira, 10 de outubro, conforme o preço de negociação no mercado secundário.
Um colapso anunciado?
A Ambipar, que chegou à Bolsa em 2020 com a promessa de ser uma líder global em gestão ambiental e emergências químicas, vive um colapso de credibilidade.
Com forte expansão por meio de aquisições alavancadas e presença em dezenas de países, a empresa agora enfrenta o peso de um endividamento elevado, receita pressionada e falta de transparência contábil.
Analistas ouvidos pelo mercado enxergam a situação como um alerta para investidores de companhias em rápido crescimento com estruturas complexas e pouca clareza operacional.
Segundo relatório da Elos Ayta, “o caso Ambipar expõe os riscos de modelos de expansão via dívida em setores intensivos em capital, especialmente quando a governança não acompanha o ritmo do crescimento”.
Com as ações negociadas abaixo de R$ 1 e a confiança abalada, a companhia agora tenta ganhar tempo para reorganizar suas finanças, enquanto o mercado precifica a possibilidade real de recuperação judicial.