A Oncoclínicas (ONCO3) aprovou nesta quarta-feira (8) um novo aumento de capital de até R$ 2 bilhões, o terceiro em dois anos, em meio a uma crise financeira e questionamentos sobre sua governança e sustentabilidade operacional.
A decisão foi tomada em assembleia de acionistas e impõe forte diluição aos investidores que não acompanharem a oferta.
A empresa emitirá até 666,6 milhões de novas ações ao preço de R$ 3 por papel, com um valor mínimo de R$ 1 bilhão para a homologação da operação.
Os investidores que aderirem à capitalização também receberão bônus de subscrição — um direito de adquirir novas ações futuramente — na proporção de um bônus para cada ação comprada.
O mercado, no entanto, reagiu mal à notícia. As ações da Oncoclínicas despencaram 12%, encerrando o pregão a R$ 3,24, o menor valor desde o IPO, e levando o valor de mercado da empresa a R$ 2,26 bilhões.
Fontes afirmam que a injeção mínima de R$ 1 bilhão deve apenas readequar o endividamento da companhia, enquanto o valor máximo de R$ 2 bilhões colocaria a empresa em uma posição mais confortável de liquidez.
De estrela a paciente
Fundada há 15 anos em Belo Horizonte (MG), a Oncoclínicas cresceu oferecendo tratamentos oncológicos, com foco em radioterapia e quimioterapia.
Após o IPO em 2021, a companhia adotou uma estratégia de expansão agressiva, adquirindo hospitais gerais e ampliando sua atuação para outras áreas médicas.
O plano, porém, não deu certo. A empresa enfrentou dificuldades de gestão fora da oncologia, aumento expressivo da alavancagem financeira e consumo elevado de caixa.
Nos últimos meses, a Oncoclínicas iniciou um processo de reposicionamento, vendendo dois hospitais, cancelando uma obra em andamento e abandonando planos de uma joint venture na Arábia Saudita.
Segundo fontes, a companhia também deve vender um terceiro hospital nas próximas semanas e suspender a construção de outros dois.
O objetivo agora é voltar às origens — concentrando-se exclusivamente em tratamentos oncológicos, seu núcleo histórico de especialização.
Desconfiança do mercado
Apesar do plano de reestruturação, o mercado continua cético quanto à capacidade da Oncoclínicas de estabilizar suas finanças.
Em relatório recente, o JP Morgan classificou o movimento de venda de ativos como uma “medida de curto prazo”, sem resolver problemas estruturais de governança e sem alterar a posição competitiva da empresa. O banco mantém recomendação “underweight” (equivalente a venda) para a empresa.
A desconfiança é alimentada por relações controversas com o Banco Master, que participou de capitalizações anteriores e hoje detém 15,18% das ações.
O banco, que enfrenta problemas financeiros, pode ser diluído na nova rodada, já que não deve aportar novos recursos.
Há também questionamentos sobre a gestão do caixa da Oncoclínicas. Parte do mercado teme que recursos estejam aplicados em ativos de risco, o que levantou dúvidas sobre a disponibilidade real desses valores.
No segundo aumento de capital, R$ 1 bilhão veio do Banco Master e outros R$ 500 milhões do CEO e fundador Bruno Ferrari.
Para acessar os recursos, a Oncoclínicas abriu conta no Banco Master e firmou um cronograma de saques, que deve se encerrar até o fim de 2025. Segundo fontes, os repasses estão sendo realizados, ainda que com pequenos atrasos.
A proposta recusada da Starboard
A situação da empresa também atraiu o interesse da Starboard Asset, que apresentou uma proposta de reestruturação financeira em setembro. A Oncoclínicas, no entanto, rejeitou a oferta, afirmando que os termos não atendiam aos melhores interesses dos acionistas.
A proposta previa mudanças na gestão, incluindo a saída de Bruno Ferrari do cargo de CEO — o que gerou resistência interna e entre investidores de longo prazo.
Embora Ferrari continue à frente da empresa, fontes próximas indicam que ele poderá retornar ao conselho de administração em um processo de transição gradual de liderança, que pode levar mais de um ano.
Dívidas, clientes e o peso da Unimed-Rio
Além dos desafios de governança, a Oncoclínicas também enfrenta problemas de recebimento. A Unimed-Rio, que no momento do IPO respondia por cerca de 20% da receita, passou a atrasar pagamentos devido à sua própria crise financeira.
As dívidas da cooperativa com a Oncoclínicas chegam a R$ 800 milhões, e desde agosto de 2025 a empresa interrompeu o atendimento à Unimed-Rio.
Esse impacto sobre o fluxo de caixa reforçou a necessidade de nova capitalização e aprofundou a pressão de credores, que monitoram de perto cláusulas de covenants — gatilhos contratuais que, se descumpridos, permitem a antecipação de dívidas.
Aumentos de capital sucessivos e perda de confiança
A atual capitalização é o terceiro aumento de capital desde 2023, o que tem alimentado o ceticismo dos investidores.
O primeiro aporte, feito a R$ 13 por ação, foi conduzido pelo Banco Master quando o papel valia cerca de R$ 7, gerando questionamentos sobre favorecimento e estrutura de governança.
Agora, com o preço a R$ 3 por ação, a diluição será ainda maior para quem não acompanhar a oferta.